Carros para abate andaram em média 24 anos na estrada
16-03-2024
Portugal ocupa o sexto lugar nos países da UE com viaturas mais velhas. Especialistas alertam para a relação com a sinistralidade.
O parque automóvel português está cada vez mais velho e a tendência não é de abrandamento. O alerta é de vários especialistas do setor automóvel e da segurança rodoviária. No ano passado, os carros destruídos em centros de abate tinham, em média, mais de 24 anos. E Portugal é o sexto país da União Europeia (UE) com mais carros com mais de 20 anos. Existem também preocupações quanto à sinistralidade: veículos mais velhos apresentam maiores níveis de gravidade em acidentes.
Os últimos dados da Associação Automóvel de Portugal (ACAP) sobre o ano de 2022 mostram que a idade média do parque automóvel português estava nos 13,1 anos. “Há mais de 1,5 milhões de veículos com mais de 20 anos” a circular no país, segundo o secretário-geral da ACAP, Hélder Pedro, e o número tem estado sempre a aumentar. Na estatística do Eurostat, Portugal aparece como o sexto de 21 países com a frota mais envelhecida no espaço comunitário.
Emitem mais CO2
A idade média dos veículos enviados para abate também está a aumentar. A Valorcar, entidade licenciada para fazer a gestão de veículos em fim de vida, aponta que, no ano passado, estava nos 24,3 anos, um novo máximo desde 2013. Um carro enviado para abate não tem de estar velho. O requisito principal para a destruição é não reunir condições para circular, o que geralmente ocorre após um sinistro.
Hélder Pedro espera que o programa de incentivos ao abate de veículos com matrícula anterior a 2007, previsto no Orçamento do Estado de 2024, avance com o novo Governo, uma vez que há “uma frota muito envelhecida”, com consequências ambientais e na segurança rodoviária. A iniciativa prevê a entrega de um valor monetário para a compra de um veículo de zero emissões ou com emissões reduzidas.
Para o secretário-geral da ACAP, o programa vai permitir retirar carros das estradas que “emitem quase 200 gramas de CO2”. Além disso, acrescenta, “os veículos recentes têm mais equipamentos de segurança”.
Por seu lado, Roberto Gaspar, secretário-geral da Associação Nacional das Empresas do Comércio e da Reparação Automóvel, diz que um parque automóvel envelhecido pode até contribuir negativamente para a procura por “circuitos paralelos” de conserto de veículos (ler abaixo).
Gravidade de sinistros
A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária detalha que, em 2022, cerca de 27% dos veículos intervenientes em acidentes com vítimas tinham 20 ou mais anos. Mais de dez mil veículos tinham quatro ou menos anos, revela a ANSR.
Um estudo sobre o impacto económico e social da sinistralidade rodoviária, publicado pelo Centro de Estudos de Gestão do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa, em outubro de 2021, referia que os acidentes “envolvendo veículos com pelo menos 20 anos apresentaram maiores índices de gravidade”, com 155 mortes e 524 feridos graves em 2019. “Tributação dos automóveis é muito elevada”
Foto: Ana Pereira da Costa / Global Imagens
Roberto Gaspar, Secretário-geral da Assoc. Nac. Empresas do Comércio e da Reparação Automóvel (ANECRA)
O envelhecimento dos veículos reflete-se nas empresas de reparação?
Se o parque automóvel for mais antigo, as empresas vão ter mais trabalho e pode ser benéfico. Mas a ANECRA apela ao rejuvenescimento dos veículos, porque podem existir outras consequências negativas. O setor recuperou a atividade face ao período pré-covid-19. Falta até pessoal especializado. Se o parque automóvel envelhece mais, os carros são tão velhos que as pessoas vão começar a fazer as reparações em circuitos paralelos. É um efeito perverso.
Porque é que a idade média dos carros em Portugal chegou aos 13 anos?
Os carros em Portugal são particularmente caros. Temos uma tributação sobre o setor automóvel bastante elevada. Tendo Portugal um nível de vida baixo, é normal que o carro seja um bem de mais difícil acesso do que em outros países. A idade do parque automóvel aumentou bastante desde 2010, no período pré e durante a troika. Seguiu-se a pandemia e a falta de carros.
Qual é a previsão para a venda dos carros novos?
Portugal está a viver a tempestade perfeita: os carros estão muito caros e as taxas de juro muito elevadas. Quando as pessoas compram os carros, o que importa não é tanto o preço do carro, mas a prestação que têm de pagar. Os fabricantes estão condicionados a fazer carros elétricos. Porém, este mercado não será massificado. Uma boa parte da população dificilmente terá acesso a um carro novo. Saber mais O que é um caso de estacionamento indevido ou abusivo?
O Código da Estrada, nomeadamente o artigo 163.º, estabelece que um veículo está em estacionamento indevido ou abusivo quando permanece 30 dias ininterruptos em local da via pública ou num parque de estacionamento isento do pagamento de qualquer taxa.
Quando é que um veículo é considerado como abandonado?
Se o veículo estiver em estacionamento indevido ou abusivo, pode ser removido do local. O dono da viatura é notificado e tem 45 dias para a levantar. O prazo encurta para 30 dias, se o veículo estiver deteriorado. É considerado abandonado, depois destes prazos legais.
O que acontece à viatura abandonada?
Passados os prazos legais, o veículo é “adquirido por ocupação” pelo Estado ou autarquias locais, explica o Código da Estrada. Seguem-se os regulamentos municipais, que preveem o abate, a venda em hasta pública ou a integração na frota das câmaras.
O proprietário do veículo paga à Câmara?
Há taxas de bloqueamento, remoção e depósito, se o condutor quiser reaver o veículo. Em alguns municípios, é possível pedir à autarquia para enviar a viatura para abate. Outros instauram contraordenações se se abandonar sucata automóvel.
Milhares de automóveis abandonados, todos os anos, na via pública
Rita Neves Costa