Aprender, aprender, aprender sempre
Nuno Crato, Professor-investigador, Cemapre, ISEG, Universidade de Lisboa; presidente da Iniciativa Educação
Hoje, 00:07
A tese da inutilidade dos exames e testes vai contra as ciências cognitivas modernas, que descobriram e estudaram experimentalmente o efeito da testagem de conhecimentos sobre a aprendizagem. E o que descobriram? Que ser-se testado é uma forma muito eficaz de consolidar a aprendizagem e de aprender.
Todos temos uma obrigação para com o futuro: o de fornecer uma educação melhor aos nossos jovens. Mas estamos a falhar. E a pandemia agravou as nossas dificuldades.
No meu ensaio Aprender, procuro olhar para os dados, os resultados da investigação científica e a experiência dos professores. Procuro extrair conclusões e defender algumas medidas simples que podem proporcionar um futuro melhor aos nossos jovens.
Começo pela pandemia, mostrando que estivemos cegos perante a realidade desde 2016, quando destruímos as avaliações nacionais que, com maior e menor sucesso, existiam desde o princípio do século XXI. Em seguida, mostro como as avaliações não só nos ajudam a conhecer a realidade, como elas próprias, as provas e os exames, ajudam a realidade a evoluir. Exponho alguns estudos científicos recentes que o mostram, com experiências e com dados estatísticos.
Mas avaliar o quê? A resposta parece simples – e é simples. Trata-se de avaliar o conhecimento e a formação dos alunos, começando pelo seu conhecimento disciplinar. No entanto, e de forma surpreendente para quem não acompanha os debates sobre educação, não é esta a resposta que mais se ouve em muitos meios educativos. Pelo contrário, fala-se em competências aplicadas, em espírito crítico, em criatividade e muitas outras componentes da formação dos jovens que não fazem sentido sem ter base no conhecimento. Daí que seja importante defender a importância do conhecimento em geral, e do conhecimento disciplinar em particular. Daí que seja importante ensinar e estudar.
Vou falar de dois ou três dos tópicos fundamentais da argumentação desenvolvida no meu ensaio Aprender, editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos.
Não é a exigência curricular que desanima os estudantes
As queixas que se ouvem, ou ouviam, de os alunos decorarem tópicos em vez de os entenderem e os assimilarem de forma profunda são, por vezes, reais. Mas não pelas razões que habitualmente se apontam. Diz-se muitas vezes que o currículo é extenso e tem pouca relação com a realidade e com os interesses dos alunos. Mas não é disso que se trata. O que leva os alunos a memorizarem cegamente a matéria é não verem nela estrutura, não verem relações entre os temas nem progressividade que torne a aprendizagem significativa.
Quando o currículo é bem estruturado, os alunos conseguem dar sentido ao estudo em vez de memorizarem factos dispersos. Conseguem não se aborrecer e ter gosto em aprender. Depois, é necessário passar à fase seguinte, a dos desafios e das descobertas.
Mas os alunos não são pequenos investigadores. Para os levar a desafios, é necessário transmitir-lhes os conhecimentos necessários, bem estruturados. Não se podem queimar etapas. E é por isso que a pura aprendizagem por descoberta não funciona. A arquitetura cognitiva humana, que tem como ponto de entrada no conhecimento uma consciência (memória de trabalho) muito estrita, necessita de avanços progressivos por pequenas etapas, tal como a psicologia moderna mostra e tal como inúmeros estudos empíricos concluem.
Uma vez adquiridos, em cada etapa, os conhecimentos essenciais, pode passar-se a uma nova fase. Pode, e deve, avançar com desafios aos estudantes. Não se trata de misturar estratégias pedagógicas, mesclando transmissão de conhecimentos e pedagogia pela descoberta, conforme algumas visões ecléticas advogam. Trata-se de ser coerente. Os desafios surgem quando os jovens têm o conhecimento e a capacidade para os enfrentar. Nessa altura, regista-se o chamado efeito de reversão da perícia, o ensino mais rotineiro deixa de desafiar os jovens e pode mesmo prejudicar a sua evolução.
Os jovens podem ser levados a desafios estimulantes se tiverem adquirido a preparação necessária e forem devidamente orientados. Não quando são irresponsavelmente deixados a si próprios.
Tudo isto deve ser claro na formulação e aplicação do currículo. Mas o plano de estudos é apenas o começo, pois trata-se de uma intenção. Em seguida, é preciso aplicá-lo e verificar a sua assimilação. Por isso é necessário avaliar.
Avaliar ajuda a aprender
Um argumento muito comum contra os testes e exames é o da sua inutilidade. Diz-se que não é por ser testado que um aluno aprende, é antes por ser ensinado e por estudar. É um argumento muito comum, embora irracional. O mesmo argumento poderia ser aplicado às análises e outros exames médicos. Não são eles que nos curam, mas nem por isso são inúteis.
A inutilidade dos testes e exames vai contra a racionalidade. E vai também contra a prática dos professores experimentados, que passam a vida a indicar trabalhos de casa e perdem noites a corrigir esses trabalhos, semana após semana, ano após ano. Os professores fazem-no porque sabem que essa é uma forma de os estudantes verificarem e reforçarem os seus conhecimentos, reverem as matérias e praticarem os procedimentos que estudam. Ou seja, os professores sabem que os alunos aprendem melhor quando se defrontam consigo próprios face a uma tarefa. E os professores experimentados fazem mais. Estão constantemente a fazer perguntas aos alunos e dão à turma trabalhos para serem feitos individualmente ou em pequenos grupos, durante ou depois da aula.
Tudo isso são formas de testar os conhecimentos – e de os reforçar. É o que se chama avaliação formativa, sem impacto, ou com pouco impacto, na classificação dos alunos.
A tese da inutilidade dos exames e testes vai também contra as ciências cognitivas modernas, que descobriram e estudaram experimentalmente o efeito da testagem de conhecimentos sobre a aprendizagem. E o que descobriram? Que ser-se testado é uma forma muito eficaz de consolidar a aprendizagem e de aprender. Tão eficaz que hoje se lhe dá um nome: o efeito de teste .
Mas a avaliação formativa não basta. É necessário que esta seja apoiada em avaliação nacional estandardizada – testes e exames -, com foco no currículo de forma a orientar e estimular o estudo dos jovens.
Um tripé de políticas educativas baseado nos dados e na experiência
Falta ainda um terceiro ponto, que completa estas duas componentes, o currículo e avaliação. Esse terceiro elemento é um plano de promoção do sucesso. Paralelamente à luta por padrões académicos elevados, é necessário apoiar os alunos com mais dificuldades. Em Portugal, isto foi definido em 2012, numa lei especial que vinculou o Estado a dar meios (créditos horários de professores) às escolas para o apoio a estudantes com dificuldades académicas. Infelizmente, essa política sistemática foi depois abandonada, sendo realçado o apoio socioemocional.
Porque é necessária esta terceira perna do tripé de políticas educativas? Porque os apoios, começando pelos apoios cognitivos, são a resolução certa do binómio exigência-dificuldades.
A maior acusação à promoção da exigência curricular e à avaliação dos estudantes é a de que tal exigência apenas serve os filhos de famílias mais favorecidas e que prejudica, deixando para trás, os jovens menos preparados, que provêm, frequentemente, de meios sociais mais desfavorecidos. Para começar, isso não é necessariamente verdade. Mas qual é a solução positiva? Reduzir a exigência, prejudicando todos? Absurdo!
PISA – Portugal
2009
2012
2015
2018
2022
Ciência: Elevado desempenho
4.2
4.5
7.4
5.6
5.0
Baixo desempenho
16.5
19.0
17.4
20.2
22.0
Média
489
501
492
484
Matemática: Elevado desempenho
9.6
10.6
11.4
11.6
7.0
Baixo desempenho
23.7
24.9
23.8
23.3
30.0
Média
487
492
492
472
Leitura: Elevado desempenho
4.8
5.8
7.5
7.3
5.0
Baixo desempenho
17.6
18.8
17.2
19.6
23.0
Média
488
498
492
477
A resposta é simples, e é frequentemente ignorada. A resposta é promover políticas de apoio especial aos alunos com mais dificuldades. Como se faz isso? Faz-se, por exemplo, destacando recursos da escola para apoiar esses estudantes, em pequenos grupos ou individualmente, em paralelo com as aulas e depois delas.
Sintetizando, precisamos de um tripé de políticas, um tripé baseado num currículo ambicioso, numa avaliação rigorosa do progresso dos estudantes e numa prática sistemática de apoio aos jovens com mais dificuldades. A experiência portuguesa mostra que conseguimos progredir enquanto nos centrámos nessas três políticas, e que começámos um retrocesso desastroso quando as abandonámos. É tudo isto que procurei tornar claro no meu ensaio Aprender.
O autor assina este ensaio também na qualidade de membro do Conselho Científico de Educação Nacional (CSEN) do governo de França, ex-ministro da Educação e Ciência (2011-2015) e autor do ensaio “Aprender”, publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, no âmbito da parceria com o Jornal Económico.
Nuno Crato, Professor-investigador, Cemapre, ISEG, Universidade de Lisboa; presidente da Iniciativa Educação
Hoje, 00:07
Nuno Crato, Professor-investigador, Cemapre, ISEG, Universidade de Lisboa; presidente da Iniciativa Educação
A Europa e os EUA: a responsabilidade dos bancos centrais
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Hoje, 00:09
BCE e Fed, enquanto instituições independentes e no âmbito das suas missões específicas, poderão constituir uma plataforma de diálogo e entendimento entre a Europa e os EUA.
Sem surpresa, o BCE, na sua reunião, de 6 de março último, decidiu baixar as taxas de juro de referência em 25 pontos base, fixando a taxa das operações principais de refinanciamento em 2,65%. Esta descida é a sétima seguida, desde setembro de 2023, momento em que esta taxa de referência atinge o seu nível mais elevado, em resultado de um processo de “normalização” da política monetária, iniciado em julho de 2023, na sequência da recuperação económica pós-Covid e das pressões inflacionistas que, entretanto, se desencadearam.
A taxa de referência passou, no curto espaço de um ano, de julho de 2022 a setembro de 2023, de 0%, o nível mais baixo de sempre (de referir que a taxa da facilidade de depósito estava fixada, nesta mesma altura, em -0,5%), até ao pico de 4,5%. Momento em que se inicia um novo processo de descida, de que a mais recente decisão é a última expressão, mas que, provavelmente, não será o fim de um ciclo.
Nesta reunião do BCE foram também publicadas as mais recentes projeções da evolução do PIB na zona euro, verificando-se uma revisão em baixa das projeções anteriores, de dezembro de 2024, em cerca de 0,2 pp, com 0,9% e 1,2%, respetivamente, para 2025 e 2026. A projeção para 2024, foi também revista, embora em ligeira alta, de 0,1 pp, para 0,8%.
Ou seja, a zona euro continua numa situação de quase estagnação que se arrasta há cerca de duas décadas e meia, a qual adquire uma dimensão crítica na fase atual, em resultado da crise profunda em que se encontra a locomotiva europeia, a Alemanha. Mais do que o controle da inflação do que se trata agora é de controlar o desenvolvimento da recessão.
A Fed, terá também a sua próxima reunião de rotina em 17 e 18 deste mesmo mês, onde serão produzidas decisões sobre a taxa de juro de referência que, neste momento, está bastante acima da taxa de juro do euro (intervalo de 4,25% a 4,5%), baseadas em novas projeções sobre a evolução da economia americana. Em qualquer caso, se utilizarmos a atualização do WEO do FMI, de janeiro de 2025, a economia americana terá crescido 2,8% em 2024, projetando-se um crescimento de 2,7% e 2,1%, para 2025 e 2026, respetivamente, o que compara, utilizando as mesmas projeções do FMI, com 0,8%, 1,0% e 1,4%, da Zona euro, para os mesmos anos.
Ou seja, constata-se que o crescimento da economia americana é mais do dobro do crescimento europeu, revelando um dinamismo superior que se vem afirmando há mais tempo. Isto, não obstante, parecerem estar em curso sinais de abrandamento, em resultado da preocupação com os efeitos internos das tarifas anunciadas por Trump.
Entretanto, a Europa iniciou um processo de revisão das suas prioridades económicas que aponta para uma reconversão industrial e uma orientação para o reforço da sua autonomia em matéria de defesa e segurança. O que implica uma alteração profunda dos objetivos e regras de gestão económica, em particular em termos de défice e de dívida pública.
Ao mesmo tempo, a Fed tem em curso a segunda revisão quinquenal do quadro da política monetária, que prevê concluir no verão e que deverá incluir uma análise dos prováveis efeitos das novas medidas de política comercial, política fiscal, imigração e regulação, anunciadas por Trump. Seria igualmente importante que o BCE atualizasse a sua própria revisão, efetuada em julho de 2021, à luz das novas prioridades económicas anunciadas.
Neste contexto de subversão completa de regras de cooperação internacional que ameaça degenerar em nova e profunda recessão global, seria importante que os responsáveis económicos, mantivessem a “cabeça fria”, e pensassem no interesse geral. E seria igualmente importante que, entre a Europa e os Estados Unidos, não se produzisse um processo de afastamento que comprometesse dramaticamente a cooperação entre os dois lados do atlântico.
Os dois bancos centrais, enquanto instituições independentes e no âmbito das suas missões específicas, poderão constituir uma plataforma de diálogo e entendimento entre a Europa e os EUA que possa contribuir para a manutenção da estabilidade económica geral, a curto prazo, e a produção, a médio prazo, de um novo sistema de regras internacionais que permita a reconstituição da dinâmica global de cooperação em novos moldes, mais ajustados às necessidades atuais.
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Hoje, 00:09
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
O que é a Europa?
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Hoje, 00:10
A resposta ao que a Europa quer do Mundo depende, sobretudo, da capacidade de se reconstruir, em termos de identidade, de projeto comum, de instituições que funcionem para além da burocracia procrastinadora que a caracteriza atualmente.
É uma questão a que não é fácil dar resposta e que hoje ganha uma nova e acrescida importância, tendo em conta tudo aquilo que se está a passar: da guerra à paz, da estagnação económica à revolução tecnológica, das instituições comuns à reemergência das nações. A tudo isto junta-se uma outra questão, que emerge do descalabro das instituições internacionais: o que quer a Europa do Mundo?
A resposta à primeira questão pode ser dada em termos geográficos: é a península mais ocidental de um grande continente que se estende de Oriente a Ocidente. Mas, esta resposta simplista por certo escamotearia a questão substantiva que é a da identidade da Europa, nas suas múltiplas expressões – culturais, económicas, sociais e políticas.
A tentação que todos temos é a de construir essa identidade com referência à matriz greco-romana, a que se junta, mais tarde, o cimento religioso cristão. Todavia, o quadro histórico-cultural que enforma o conceito de Europa é mais complexo e muitas outras dimensões estão presentes, que são o resultado de interações entre diversos povos e culturas. Interações que, não obstante terem produzido uma dinâmica histórica de construção e consciência de uma identidade comum, não deixaram de produzir, simultaneamente, tensões e contradições que tiveram expressões particulares ao longo da História e que alimentaram processos de formação e substituição de hegemonias, de produção de conflitos e pacificações, de integração e desintegração.
Tudo indica que a Europa se aproxima – ou já está a sofrer os impactos – de uma situação de rotura que irá necessariamente desembocar numa alteração radical de dinâmicas e de relação de forças internas que não irão produzir, necessariamente, um patamar superior de identidade e de coesão em torno de princípios e de desideratos comuns, como aconteceu no passado. Uma situação de rotura que não deixa de exprimir, simultaneamente, a alteração radical da arquitetura política e institucional internacional que se tem vindo a produzir e que terá sido acelerada pelas recentes eleições americanas.
Neste processo, a Europa perdeu a capacidade de inovação, de referência para as transformações positivas e de capacidade de afirmação, apostando num modelo económico orientado para a exportação e para a competitividade pelos custos, que se traduziu na incapacidade de acompanhar a revolução tecnológica e na estagnação estrutural, tal como reconhecido no relatório Draghi. E, infelizmente, parece não ter conseguido, ainda, encontrar o caminho para sair da situação.
A resposta ao que a Europa quer do Mundo é ainda mais complexa e depende, sobretudo, da capacidade de se reconstruir, em termos de identidade, de projeto comum de existência, de instituições que funcionem para além da burocracia procrastinadora que a caracteriza atualmente. E, sobretudo, da capacidade da Europa de, mais uma vez, saber aproveitar a crise que atravessa para dar um salto em direção a uma maior integração económica e política que não se deixe hegemonizar por um qualquer interesse particular, mas seja capaz de produzir um interesse comum a partir do reconhecimento e valorização das potencialidades nacionais. Particularmente daquelas que estiveram na base da construção do mundo global que hoje está em risco de regredir para níveis inimagináveis, pouco tempo atrás.
Para terminar, uma referência à Mensagem de Fernando Pessoa onde, talvez, a resposta ao que a Europa é e quer do mundo possa encontrar uma referência inspiradora, logo no primeiro poema, “O dos Castelos”: “A Europa jaz, posta nos cotovelos; de Oriente a Ocidente jaz fitando … Fita com olhar esfíngico e fatal, o Ocidente futuro do passado. O rosto com que fita é Portugal”.
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Hoje, 00:10
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Eleições na Alemanha: economia ou ideologia?
Joana Santos Silva, CEO e Professora, ISEG Executive Education
Hoje, 00:07
Se a Alemanha quiser evitar uma polarização ainda maior, precisa de encontrar formas de construir pontes entre o leste e o ocidente, o que implica um novo olhar sobre a economia e a identidade nacional.
Os recentes resultados das eleições na Alemanha evidenciam um avanço preocupante da extrema-direita, particularmente na antiga Alemanha Oriental. Enquanto no Ocidente a Alternativa para a Alemanha (AfD) continua a ser uma força marginal, no Leste tornou-se uma potência política, liderando intenções de voto em alguns estados e consolidando a sua influência. Mas a que se deve esse desvio para o radicalismo de forma tão acentuada no Leste? Será uma questão puramente ideológica, ou há fatores económicos estruturais que alimentam esta tendência?
Trinta e cinco anos após a reunificação, a Alemanha Oriental ainda luta para alcançar o nível de desenvolvimento da Ocidental. Embora Berlim tenha injetado centenas de biliões de euros para modernizar a infraestrutura e integrar economicamente as regiões orientais, a realidade é que as disparidades persistem.
Há pouco mais de 15 anos, trabalhei diariamente com alemães em duas cidades do Ocidente e era notório a forma diferenciada (potencialmente discriminatória) com que se referiam aos colegas da Alemanha de Leste. O sentimento passado era de que os mesmos seriam menos competentes e certamente menos sofisticados.
Será por isso que os salários no Leste continuam significativamente mais baixos? Persistirá uma perceção de inferioridade dos quadros vindos do Este? Em média, os trabalhadores orientais ganham cerca de 15% menos do que os seus compatriotas ocidentais. O desemprego também é historicamente mais alto.
Como tal, jovens qualificados e ambiciosos tendem a migrar para o Ocidente em busca de melhores oportunidades, deixando para trás uma população envelhecida e mais desconfiada em relação à globalização e às mudanças sociais. Esse ciclo reforça a sensação de estagnação e frustração que muitos eleitores sentem.
Para muitos alemães orientais, a reunificação, que prometia prosperidade e igualdade, não trouxe os resultados esperados. O choque económico da década de 1990 gerou uma desconfiança profunda em relação às elites políticas e económicas da Alemanha Ocidental. Até hoje, essa desconfiança reflete-se em altos níveis de ceticismo em relação aos partidos tradicionais e às instituições governamentais, um terreno fértil para o crescimento de partidos populistas e extremistas.
Muitos argumentam que o apoio à extrema-direita no Leste é impulsionado pelo aumento da imigração e, de facto, a AfD tem explorado esse tema com grande eficácia. No entanto, é importante notar que, paradoxalmente, a Alemanha Oriental tem uma população imigrante muito menor do que a Ocidental. O que está em jogo não é a perceção de que as políticas governamentais priorizam a imigração em detrimento da população local.
Para um eleitor oriental que se sente economicamente esquecido há décadas, ver biliões de euros alocados a programas de integração de refugiados pode parecer mais um sinal de que o governo se preocupa pouco com os seus problemas.
Há também um argumento ideológico a considerar. Durante décadas, a Alemanha Oriental viveu sob dois regimes totalitários – o regime nazi seguido pelo regime comunista autoritário, que promoviam uma visão nacionalista e enfatizavam uma identidade cultural homogénea. É difícil empatizar em como esse histórico possa ter deixado um legado de resistência a valores liberais, tornando o eleitorado oriental mais recetivo a discursos nacionalistas.
O crescimento da extrema-direita na Alemanha Oriental não pode ser explicado por um único fator. A combinação de frustração económica, desilusão política e um senso de identidade ameaçada tem sido instrumental para o fortalecimento da extrema-direita. Para conter essa ascensão, não basta apenas combater discursos xenófobos; é fundamental reduzir as desigualdades regionais, criar oportunidades económicas reais e restaurar a confiança dos cidadãos no sistema político.
Se a Alemanha quiser evitar uma polarização ainda maior, precisa de encontrar formas de construir pontes entre o leste e o ocidente – e isso passa necessariamente por um novo olhar sobre a economia e a identidade nacional.
Esperemos que possam encontrar um caminho bem-sucedido nesse sentido, pois serão lições que poderão servir para outros países, incluindo Portugal.
Joana Santos Silva, CEO e Professora, ISEG Executive Education
Hoje, 00:07
Joana Santos Silva, CEO e Professora, ISEG Executive Education
Ousar crescer: a coragem de mudar começa na ´governance´
Carolina Afonso, Professora Universitária ISEG
Hoje, 00:08
As organizações que querem crescer precisam, antes de tudo, ousar crescer. Tal significa abandonar a mentalidade de segurança excessiva e abraçar a mudança como motor de crescimento.
A gestão da mudança não pode ser um mero exercício teórico ou um plano detalhado sem execução. Num mundo em que a mudança e, em alguns casos, até a disrupção são a regra, e não a exceção, o crescimento das organizações depende cada vez mais da capacidade de mudar. Contudo, muitas empresas desejam expandir, mas poucas ousam crescer de fato. Esse paradoxo reflete uma governance que frequentemente encara a mudança como um risco a ser minimizado, e não como uma oportunidade a ser explorada.
De acordo com um estudo da Harvard Business Review, a resistência à mudança é um dos principais fatores que limitam o crescimento sustentável das empresas. O estudo destaca que, embora 70% dos executivos reconheçam a necessidade de transformação, apenas 30% das iniciativas de mudança são bem-sucedidas. O motivo? A falta de compromisso efetivo da alta liderança em tornar a mudança uma prioridade estratégica e operacional.
Para que uma empresa realmente cresça, a mudança precisa ser incorporada na sua governance, com direções claras e compromisso da liderança a todos os níveis. A MIT Sloan Management Review destaca que empresas que alinham a sua estrutura de governance com uma mentalidade de inovação têm mais 50% de oportunidades de atingir seus objetivos de crescimento.
Para uma organização ousar crescer, é preciso desenvolver uma cultura que aceite o risco como parte do processo. A McKinsey argumenta que empresas que adotam uma cultura de “fail fast, learn faster” têm maior probabilidade de crescer de forma consistente. Tal significa que a gestão da mudança precisa ser mais do que um conjunto de diretrizes; deve incorporar o ADN da organização, permitindo que os líderes tomem decisões rápidas e calculadas.
A Deloitte também aponta que a falta de ousadia na gestão da mudança está frequentemente relacionada a um modelo de liderança tradicional e hierárquico. Líderes que estimulam a autonomia, a inovação e a colaboração entre equipas têm maior sucesso em transformar as suas organizações.
Como criar um modelo de mudança efetivo?
Para que a mudança deixe de ser apenas um discurso e passe a ser uma prática efetiva, algumas ações são fundamentais:
Compromisso da Alta Liderança – O C-Level precisa ser o primeiro a demonstrar abertura à mudança e garantir que ela seja uma prioridade estratégica.
Cultura de Experimentação – Testar novas abordagens e permitir pequenos fracassos controlados criam um ambiente de aprendizagem contínua.
Estruturas Flexíveis – Modelos organizacionais rígidos são um obstáculo. Equipas ágeis e descentralizadas facilitam a implementação da mudança.
Tecnologia e Dados – Utilizar informações baseadas em dados permite uma tomada de decisão mais rápida e eficiente.
Gestão Contínua – A mudança não é um evento isolado, mas um processo contínuo de evolução.
Concluindo, as organizações que querem crescer precisam, antes de tudo, ousar crescer. Tal significa abandonar a mentalidade de segurança excessiva e abraçar a mudança como motor de crescimento. A governance tem um papel essencial nesse processo, pois é nela que se definem as estruturas, os incentivos e a cultura que permitirão à empresa transformar o desejo de crescer numa realidade concreta.
O futuro pertence às organizações que, não apenas falam em mudança, mas que a fazem acontecer.
Carolina Afonso, Professora Universitária ISEG
Hoje, 00:08
Carolina Afonso, Professora Universitária ISEG
De te fabula narratur!
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Hoje, 00:08
A Europa não pode ser simples espectadora dos acontecimentos, limitando-se a invocar princípios que mais não são do que disfarces para a falta de estratégia e inépcia que a tem caracterizado.
Fazendo jus ao símbolo do seu Partido, Donald Trump reentrou na cena política e económica, como um elefante numa loja de porcelanas. Para lá da imagem paquidérmica que possamos associar à forma como as novas medidas de política comercial e de posicionamento internacional foram anunciadas, a realidade é que o mundo mudou e nada ficou como dantes.
Isto, apesar das reações tímidas e cautelosas da generalidade dos responsáveis dos países vizinhos e europeus que parecem não ter compreendido que não se está apenas a assistir ao simples anúncio de medidas protecionistas, mas em presença de uma mudança qualitativa na relação dos EUA com o Mundo, que se vem desenvolvendo ao longo das últimas três ou quatro décadas e que se acelerou, sobretudo a partir da crise económica e financeira de 2008-2009. Que terá em Trump uma expressão histriónica, mas que se encontra em continuidade com a ação de Biden e mesmo de Obama, no sentido de uma “reterritorialização” do poder da economia americana.
Uma mudança qualitativa cujo desfecho final é ainda impossível de prever, em toda a sua dimensão, na medida em que o que está em movimento é uma radical alteração do sistema de relações de forças e da arquitetura do poder global que se afirmou no pós Segunda Guerra Mundial.
É importante relembrar que o fim do sistema monetário internacional de Bretton Woods terminou precisamente com o anúncio feito pelo presidente Nixon, em agosto de 1971, de suspensão unilateral da convertibilidade-ouro do dólar, suspensão das ajudas externas e a aplicação de uma tarifa excecional de 10% sobre as importações, provocando a primeira crise económica mundial do pós-guerra, a brutal subida do preço do petróleo e o lançamento sobre os países europeus e importadores de petróleo, dos custos da recuperação do papel internacional do dólar. Esta intervenção unilateral dos EUA teve, como contrapartida positiva, a reação imediata dos responsáveis europeus, com a aceleração do processo de integração europeia que levou à criação do euro.
A situação atual é muito semelhante à do início dos anos 70 do século passado, com os EUA a registarem défices na sua balança corrente, agora em estreita articulação com os défices orçamentais e o aumento da dívida pública, onde a maior competitividade europeia poderá ter desempenhado algum papel. Mas a causa fundamental está no modelo de economia global afirmado, a partir do início dos anos 90 do século passado, pela articulação dos EUA com a China, em que esta se integrou na economia global através da ligação privilegiada ao dólar, aceitando investimento direto americano em troca de excedentes comerciais com os EUA, pagos em dólares que eram reenviados para a origem, através da aquisição de títulos americanos.
Este modelo, de parceria tácita EUA-China, entrou em rotura com a crise de 2008-2009, mas não deixou de ter efeitos estruturais na economia global que se prolongaram e acentuaram depois disso, com a afirmação económica, tecnológica, política e militar da China que veio provocar a desestabilização do sistema de relações de força e da hegemonia americana na economia global.
E, se o que vem aí é difícil de prever, a Europa não poderá ser simples espectadora dos acontecimentos, limitando-se a invocar princípios que mais não são do que disfarces para a falta de estratégia e inépcia que a tem caracterizado. De vez em quando, faz sentido reler os clássicos, fundadores da civilização ocidental, como o poeta Horácio e as suas Sátiras.
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Hoje, 00:08
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Economias de Portugal e Espanha sobressaem na Europa com turismo e imigração a ajudar
Segundo os dados divulgados pelo Eurostat, o Produto Interno Bruto (PIB) da zona euro aumentou 0,7% em 2024 e o da União Europeia 0,8%. Entre os países da zona euro, Portugal apresentou, no quarto trimestre de 2024, o terceiro maior crescimento homólogo do PIB (2,7%).
Portugal e Espanha tiveram em 2024 um desempenho acima da média europeia, assumindo o papel impulsionador da economia da zona euro, à boleia do turismo, imigração e menores custos energéticos, um caminho que os economistas acreditam que se vá manter.
Segundo os dados divulgados pelo Eurostat, o Produto Interno Bruto (PIB) da zona euro aumentou 0,7% em 2024 e o da União Europeia 0,8%. Entre os países da zona euro, Portugal apresentou, no quarto trimestre de 2024, o terceiro maior crescimento homólogo do PIB (2,7%), depois da Lituânia (3,6%) e de Espanha (3,5%) e o maior na variação trimestral (1,5%), com Espanha em terceiro (0,8%).
Por outro lado, as economias da Alemanha, conhecida como o motor da Europa, e da Áustria foram as que mais recuaram na variação homóloga, com uma contração de 0,2%. Já na variação trimestral, as maiores quebras observaram-se na Irlanda, Alemanha e França.
Portugal e Espanha estão, assim, entre as economias com melhor desempenho, tendo representado cerca de 50% do crescimento do euro no último trimestre do ano, segundo analistas da JP Morgan.
As perspetivas são para que estas economias ibéricas sigam a tendência: “Esperamos que as economias espanhola e portuguesa continuem a ter um desempenho claramente superior numa zona euro em dificuldades este ano”, salienta uma nota de análise da Oxford Economics.
Além disso, ambos os países reduziram as suas vulnerabilidades macrofinanceiras de longa data. “Uma melhoria das perspetivas demográficas também significa que estamos mais otimistas em relação ao crescimento a longo prazo de Espanha e Portugal do que outras economias periféricas”, notam os economistas.
“O crescimento está a ser impulsionado por alguns fatores comuns, tais como a natureza orientada para os serviços de ambas as economias, a expansão dos setores do turismo e os fortes fluxos migratórios líquidos”, que permitem crescimento populacional, salientam.
Para Filipe Grilo, especialista em Economia da Porto Business School, o “crescimento diferenciado destas duas economias em relação ao restante espaço europeu pode ser explicado por três grandes conjuntos de fatores: a estrutura económica, os custos energéticos e fatores conjunturais específicos”, segundo indica à Lusa.
Economias mais orientadas para os serviços do que para a indústria contribuem para este desempenho, bem como a menor exposição ao choque energético provocado pela guerra na Ucrânia, afirma o economista.
Além disso, outro fator é a imigração, que “tem sido fundamental para sustentar o crescimento dos serviços, sobretudo os de menor valor acrescentado”, diz.
Ricardo Ferraz, professor no ISEG e na Universidade Lusófona, também destaca, em declarações à Lusa, que “o consumo das famílias teve um papel decisivo no desempenho da economia portuguesa, e que o turismo terá voltado a dar um contribuído importante”, com o mesmo a aplicar-se ao caso espanhol.
“As projeções apontam para que Portugal e Espanha voltem a crescer este ano à boleia do consumo privado e do turismo, sendo também esperada uma aceleração do investimento”, avança o economista. Pelo que, “não sucedendo nenhuma catástrofe, os próximos anos deverão continuar a traduzir-se em aumentos dos rendimentos das famílias, o que alimentará o consumo privado, e num bom desempenho do turismo (ambas as economias beneficiam de excelentes condições enquanto destinos turísticos)”.
No entanto, ressalva que “os grandes motores da zona euro estão a marcar passo”, e por isso, “Portugal não pode contentar-se com o facto de estar a crescer acima da média europeia, dado que essa média é baixa”, defende o economista.
Os analistas da Oxford Economics dizem também que ainda preveem “pouca convergência adicional para os níveis de rendimento per capita da zona euro para Espanha e Portugal”.
“A prevalência de empregos de baixo valor acrescentado, mantendo a produtividade baixa e o fraco investimento prolongado, serão fatores-chave que atrasarão as suas perspetivas a longo prazo”, defendem.
Quanto ao impacto deste novo equilíbrio nas economias da zona euro, Filipe Grilo admite que o crescimento português “dificilmente terá um impacto económico significativo noutros países, como a cadeia de valor dos setores que mais crescem em Portugal e Espanha não está fortemente interligada com os restantes países europeus”.
Ainda assim, é possível existir um efeito político, já que “se o diferencial de preço da eletricidade persistir, poderá gerar pressão política para que França desbloqueie o acesso do resto da Europa à energia produzida na Península Ibérica”.
Jornal Económico com Lusa
Quando a sociedade silencia
Joana Santos Silva, CEO e Professora, ISEG Executive Education
Hoje, 00:08
Não podemos continuar numa sociedade em que a agressão de uma pessoa é uma tragédia, mas a de muitas é uma estatística. Temos que rescrever a narrativa sobre violação e o papel do agressor e o da vítima.
A urgência de combater a violência contra as mulheres
A recente onda de denúncias de violações em Lisboa, incluindo casos em hostels e envolvendo motoristas de TVDE, evidencia uma realidade alarmante: a persistência da violência sexual contra as mulheres na nossa sociedade. De janeiro a setembro de 2024, foram reportados 344 casos de violação em Portugal, um número que, embora elevado, provavelmente subestima a verdadeira dimensão do problema, devido à subnotificação e ao estigma associado.
A normalização deste crime está enraizada em fatores culturais e sociais que perpetuam a desigualdade de género. Muitas vezes, as vítimas são responsabilizadas pela agressão, com perguntas insinuando culpa, como “O que estavas a vestir?” ou “Porque estavas sozinha a essa hora?”. Esta culpabilização não só desvia a atenção do agressor, como também desencoraja outras vítimas de denunciarem, perpetuando um ciclo de silêncio e impunidade.
As vítimas enfrentam ainda barreiras institucionais ao procurarem justiça. Processos legais morosos, questionamentos invasivos e a falta de sensibilidade por parte de alguns profissionais podem retraumatizar as vítimas e dissuadi-las de prosseguir com acusações. Esta revitimização institucional contribui para a perpetuação da ideia de que denunciar não vale a pena, alimentando a impunidade dos agressores.
“Está na hora de mudar a sociedade que banaliza a violação”, diz Gisèle Pelicot. Não podemos continuar numa sociedade em que a agressão de uma pessoa é uma tragédia, mas a de muitas é uma estatística. Temos que rescrever a narrativa sobre violação e o papel do agressor e o da vítima.
O exemplo marcante do caso de Gisèle Pelicot, uma mulher francesa que, durante quase uma década, foi drogada e violada pelo próprio marido, Dominique Pelicot, que também permitiu que outros homens a agredissem sexualmente sem o seu conhecimento. Gisèle demonstrou uma coragem notável ao enfrentar os seus agressores em tribunal, recusando o anonimato e insistindo num julgamento público para expor a gravidade dos crimes cometidos contra ela. A sua postura destemida sublinha que a vergonha deve recair sobre os violadores, não sobre as vítimas.
Assim, para combater este flagelo, é imperativo implementar políticas públicas que promovam a igualdade de género e a educação sexual desde cedo, desmistificando mitos e desconstruindo estereótipos nocivos. Campanhas de sensibilização devem enfatizar o consentimento e o respeito mútuo, enquanto os media têm a responsabilidade de retratar as mulheres de forma digna e igualitária.
As instituições judiciais e policiais necessitam de formação especializada para lidar com casos de violência sexual, garantindo um atendimento humanizado e eficaz às vítimas. A criação de estruturas de apoio psicológico e legal é essencial para auxiliar as sobreviventes no processo de recuperação e busca por justiça.
A sociedade como um todo deve refletir sobre as atitudes e comportamentos que perpetuam a violência contra as mulheres. É necessário um compromisso coletivo para desmantelar as bases culturais que normalizam a violação e para construir uma comunidade onde todas as pessoas, independentemente do género, possam viver sem medo de violência ou discriminação.
A mudança começa com a educação e a consciencialização, mas requer também ação concreta e contínua de todos os setores da sociedade. Somente através de um esforço conjunto poderemos erradicar a violência sexual e garantir um futuro mais seguro e igualitário para as mulheres em Lisboa e em todo o país.
Joana Santos Silva, CEO e Professora, ISEG Executive Education
Hoje, 00:08
Joana Santos Silva, CEO e Professora, ISEG Executive Education
Um novo paradigma de competitividade
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Hoje, 00:10
É tempo de se pensar na produção de uma parceria entre o sector empresarial e o Estado que permita explorar as vantagens da iniciativa privada e do funcionamento do mercado.
A utilização do termo competitividade banalizou-se, nas três ou quatro últimas décadas. É utilizado na Economia, nas diferentes dimensões, micro, meso, macro, transversal, ou vertical, nacional, internacional ou global, mas também noutras áreas, incluindo a Psicologia, os Comportamentos, a Política, etc.
A maior parte das vezes, infelizmente, é utilizado de forma simplista, sem ter presente a complexidade que está associada à sua génese, desenvolvimento e sustentabilidade, no médio e longo prazo.
Uma das mais interessantes definições de competitividade deve-se ao professor Emérito Stéphane Garelli, referência das análises promovidas pelo IMD. Segundo este autor, e fazendo uma tradução livre, “A competitividade é a capacidade de criar valor acrescentado e, portanto, de aumentar a riqueza nacional através da gestão de ativos e processos, de atratividade e agressividade, de globalidade e proximidade, e integrando estas relações num modelo económico e social” (“World Competitiveness Yearbook”, 1966).
Esta definição implica considerar a relação entre o ambiente nacional de um país – onde o Estado tem um papel fulcral – e o processo de criação de riqueza, levado a cabo pelas empresas e pelos diversos agentes económicos. Isto significa, ainda, que um país pode ser rico e não necessariamente competitivo, vivendo de rendimentos sem, efetivamente, criar valor acrescentado novo. Ou pode não ser tão rico assim e ser competitivo, criando efetivamente valor acrescentado novo.
Nesta perspectiva, a competitividade não poderá ser resumida a uma simples expressão cardinal, mas antes a um conjunto de fatores que, integrados, contribuem para a criação de um ambiente económico próprio que permite o desenvolvimento competitivo e sustentado de um país.
Vários serão esses fatores, variando com o tempo, as alterações estruturais da economia e a envolvente externa do país. Mas, não poderão deixar de estar ligados ao desempenho económico geral, à eficiência da ação governativa, à eficiência do sector empresarial ou ao nível e qualidade geral das infraestruturas, sem esquecer o funcionamento das instituições, ou a evolução do nível educacional, cultural e de saúde pública.
Isto significa, também, que a competitividade de um país não pode ser obtida apenas a partir da mera agregação de desempenhos particulares, mas através da criação de um sistema integrado, com diferentes níveis de produção de eficiência e desempenho que vão do nível empresarial à definição da política económica pelo Estado, passando pela introdução de uma perspectiva estratégica que deve permitir a integração de projetos e a sua coerência sistémica.
A dinâmica de globalização, assente na acelerada abertura das economias e na constituição de cadeias globais de valor acrescentado, parece ter entrado em regressão, com a emergência de novas tendências que apontam para um fracionamento da economia global, a constituição de polos de interesses diferenciados e mesmo antagónicos, e movimentos espontâneos ou forçados de renacionalização económica sob diferentes formas, incluindo uma nova reindustrialização e reforço de relações de proximidade, baseada em afinidades de diversa natureza.
Portugal não se pode resignar a ser um agente passivo desta reconfiguração profunda das relações económicas que se está a processar à escala global, devendo desde já preparar-se para responder aos desafios de uma nova competitividade que assentará, sobretudo, em mais diversificação, coerência e sustentabilidade dos sistemas produtivos internos e maior flexibilidade na resposta aos novos estímulos externos.
É tempo de se pensar na produção de uma parceria entre o sector empresarial e o Estado que permita explorar as vantagens da iniciativa privada e do funcionamento do mercado, em articulação com a introdução de uma perspectiva estratégica de longo prazo. Uma espécie de Parceria Público-Privada macroeconómica que permita produzir uma competividade sistémica que se afirme como novo paradigma da economia portuguesa.
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
Hoje, 00:10
António Mendonça, Professor Catedrático do ISEG -ULisboa, Bastonário da Ordem dos Economistas
A importância da literacia mediática e o poder da informação
Carolina Afonso, Professora Universitária ISEG
Hoje, 00:06
É importante garantir que a transparência e a ética prevalecem sobre a manipulação. Afinal, sem uma informação livre e fiável, não há democracia que resista.
Esta semana, a tomada de posse do presidente dos Estados Unidos para o novo mandato deixou claro o peso que os grandes empresários e as suas redes de influência exercem na política e nos media.
Donald Trump construiu grande parte do seu percurso político apoiando-se em figuras do mundo empresarial que, além de deterem gigantes económicos, também controlam meios de comunicação e as redes sociais. Este cenário levanta questões cruciais sobre a relação entre poder político, económico e mediático, especialmente num momento em que a desinformação continua a ameaçar a democracia.
Elon Musk, um dos empresários mais influentes da atualidade e proprietário da rede social X (antigo Twitter), é um exemplo paradigmático. Desde que adquiriu a plataforma, Musk tem promovido a ideia de liberdade de expressão irrestrita, mas as consequências têm sido controversas. Com a diminuição das políticas de moderação de conteúdos, a X tornou-se num espaço fértil para a propagação de fake news, teorias da conspiração e discursos polarizadores. Musk, frequentemente associado a Trump, já demonstrou estar disposto a usar a sua posição para influenciar debates políticos e moldar narrativas públicas.
Outro nome de destaque é Jeff Bezos, dono da Amazon e do jornal “The Washington Post”. Embora o jornal mantenha um histórico de reportagens de qualidade, a concentração de poder mediático nas mãos de Bezos levanta preocupações sobre possíveis conflitos de interesses entre a cobertura jornalística e os seus interesses económicos. Além disso, outros empresários próximos do círculo de Trump, como Peter Thiel, continuam a investir em meios de comunicação e plataformas digitais, amplificando vozes conservadoras alinhadas com a sua visão política.
A concentração de poder nos meios de comunicação tem profundas implicações na forma como o público consome informação. Estudos indicam que as fake news, muitas vezes sensacionalistas, conseguem captar a atenção de forma mais eficaz do que notícias verdadeiras. O sensacionalismo, aliado aos algoritmos das redes sociais, faz com que estas notícias se disseminem de forma exponencial.
Um estudo do MIT demonstrou que as notícias falsas circulam até seis vezes mais rápido do que as verdadeiras. Esta dinâmica é alimentada por manchetes emocionais e sound bites, que permanecem na memória coletiva mesmo após serem desmentidos. Num contexto como o das eleições norte-americanas, estas distorções informativas podem alterar perceções e influenciar decisões de forma alarmante.
Para mitigar os efeitos da desinformação, é necessário adotar uma abordagem multifacetada. Em primeiro lugar, é importante reforçar a literacia mediática da população para que sejam capazes de identificar fontes confiáveis, questionar as informações que consomem e verificar factos. Ao mesmo tempo, as empresas tecnológicas necessitam assumir responsabilidades mais claras. Contudo, estas iniciativas só terão sucesso se forem acompanhadas por regulamentações que estabeleçam normas éticas claras para o funcionamento destas plataformas.
Um outro elemento indispensável é o fortalecimento do jornalismo independente.
Neste momento crítico, em que os interesses políticos, económicos e mediáticos se interligam de forma tão evidente, a luta contra a desinformação é mais relevante do que nunca. A verdade não só é essencial para garantir a integridade das democracias, mas também para permitir que os cidadãos tomem decisões informadas e responsáveis. É importante garantir que a transparência e a ética prevalecem sobre a manipulação. Afinal, sem uma informação livre e fiável, não há democracia que resista.
Carolina Afonso, Professora Universitária ISEG
Hoje, 00:06
Carolina Afonso, Professora Universitária ISEG